A origem do povo cigano, apesar de já ser muito estudada e documentada com fatos e dados reais, ainda é um assunto que fica envolvido em mistérios e fantasias, por ser um povo considerado mágico, errante e admirável.
Por isso, há alguns contos que procuram promover a origem do povo cigano de uma forma mais surpreendente e imaginativa, de forma que permita dar espaço à concepções individuais.
Confira, à seguir, um conto sobre a origem do povo cigano, e que mais parece um sonho.
Uma antiga lenda fala de um povo que habitava o subterrâneo de uma ilha fantasma, perdida no meio do Oceano Atlântico.
Essa ilha era permanentemente encoberta por denso nevoeiro, e somente um dia a cada sete anos tornava-se visível.
Os habitantes desse lugar viviam nas escuras profundas, o que os tornava um povo privado de luz, do contato com diversos elementos da Natureza e, sobretudo, da liberdade.
Os dias naquele lugar passavam sem que a população experimentasse qualquer fato novo, qualquer emoção, qualquer mudança numa entediante rotina.
Predominavam a mesmice e a resignação. E foi assim que um rapaz, quando perambulava pelo lugar, avistou uma claridade em um canto e resolveu segui-la.
Ele viu uma estreita passagem. Curioso, decidiu seguir em frente. Arrastou-se pela fenda, caminhou, escalou, saltou, até que se viu na superfície nunca antes pisada.
A emoção que aquele homem sentiu, naquele momento, é indescritível. Imagine uma vida inteira transformada de um instante para outro.
Viu a claridade jamais experimentada. Surpreendeu-se com as árvores imensas e os arbustos, e os pássaros, e o boi, e as borboletas, e o ribeirão, e as nuvens.
Ficou em pânico quando o sol desapareceu, e a noite surgiu. E, com ela, uma misteriosa bola branca e arredondada.
Ficou encantado com aquele manto bordado de muitos pontos luminosos, uns mais fortes, outros mais fracos. Caminhou, caminhou, até que, exausto, adormeceu.
Acordou com a claridade, e viu-se cercado de gente curiosa, mas amistosa. Contou a sua história e ouviu a deles. Comeram, cantaram e dançaram em torno da fogueira, quando o céu novamente enegreceu.
Passada uma semana, a saudade de seu povo apertou. Ele prometeu voltar, mas embrenhou-se pelo mesmo caminho e retornou à profundeza.
De volta, foi recebido com festa, mas também com recriminação. Seu lugar era aquele e qualquer outro era proibido, devendo ser esquecido como um sonho mau.
Mas o rapaz falou:
– Como a claridade, o céu azul, as nuvens, as estrelas, o horizonte podem ser maus?
Ele teve vontade de ter aquilo tudo como um direito e não como uma aventura proibida. Logo, não apenas ele, como todos aqueles aos quais relatou sua maravilhosa experiência, foram tomados por uma onda de inconformismo e de curiosidade.
Queriam a luz, o sol, o verde, a liberdade. Queriam a vida. E por ela foram até a divindade. Generosa e compreensiva, a divindade atendeu ao pedido daquela gente essencialmente boa e disse:
– Vocês estão livres para viver na superfície, mas existem condições: vocês não terão uma terra sua para que possam conhecer todas as terras. Serão errantes e terão carroças como casas. Terão, assim, uma vida de magia, alegria e encantamento. E serão filhos do vento, do sol, da lua e das estrelas.
E assim foi feito e surgiu o povo cigano.
Adaptação de Augusto Pessôa
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